Ecce Deus! Como compreender Jesus Cristo.
José de Paiva Netto – jornalista e escritor
Para melhor entender a forma como eu compreendo o Divino Mestre e Senhor Jesus Cristo, trago para o seu conhecimento um artigo que escrevi em 1989 e que foi destaque também na imprensa internacional:
Dessectarizar Jesus
O vice-presidente da Associação Universal de Esperanto, jornalista Roman Dobrzyñski, da TV Polonesa, esteve no Brasil para participar da inauguração do Templo da Boa Vontade, em Brasília-DF; era 21 de outubro de 1989.
Na ocasião, em entrevista, ele me perguntou: “Paiva Netto, como pode a Religião de Deus pregar o Ecumenismo Irrestrito, falando em Jesus?”.
Respondi-lhe que uma das grandes tarefas da Religião Divina é justamente dessectarizá-Lo. O Divino Mestre não é sectarismo. Ele é uma ideia extraordinária de Humanidade, Amor, Fraternidade e Justiça. Eis um destacado serviço que a Religião de Deus está prestando à sociedade mundial.
(...) Contra ou a favor, as pessoas se manifestam sobre Suas palavras e exemplos. Não existe neutralidade quanto a Ele... Por isso, há alguns que caçoam: “Ah, esse Paiva fica falando em Jesus na política, Jesus na ciência, Jesus na economia!... Ora! Jesus é só para a Religião, e olhe lá!”.
Mas será que é mesmo assim? Tenho certeza de que não! E, de qualquer maneira, alguém que me assistirá na Polônia, embora não concordando comigo, pode ser levado a pensar um pouquinho a respeito do assunto... Quem sabe se não tenho, nem que seja uma coisinha desse tamanhozinho de razão? Ademais, uma frondosa árvore antes foi uma sementinha...
Foi assim que eu externei meu ponto de vista sobre o Divino Mestre.
A natureza de Deus,
o Sublime Criador.
Pois bem. Ecce Deus! sugere uma imparcial e profunda reflexão sobre a natureza do Criador. Como ressaltei, não se trata de um evento “quadradinho”. Estão sendo convidados ao debate e a unidade ecumênica igualmente os que não acreditam em Deus, pois somos todos irmãos planetários.
Ninguém é dono da Verdade nem ditador do saber, pois neste mundo só existe perspectiva de conhecimento. Todos, portanto, tem o direito, incluída a plateia, de manifestar-se de forma eloquente, porém civilizada, é claro!, a exemplo do Fórum Mundial Permanente Espírito e Ciência — o primeiro ocorreu de 18 a 21 de outubro de 2000, no ParlaMundi da LBV, Parlamento Mundial da Fraternidade Ecumênica, em Brasília-DF, numa série de festividades promovidas pela entidade sob o nome de “Bem-vindo, Ano 2000!”.
Eis alguns pontos de minhas conversas com aqueles que me honram com sua paciência. Cumpre esclarecer, no entanto, que não se trata de produção literária científico-religiosa, porém de um bate-papo com os presentes e que foi transmitido, ao vivo, para a nossa fiel audiência.
Encontramos no Evangelho de Jesus, segundo São João, no capítulo 19, versículo 5, esta citação histórica:
— Saiu, pois, Jesus, levando a coroa de espinhos e a veste de púrpura. E disse Pilatos aos que exigiam a morte Dele: Eis aqui o homem (Em latim:Ecce Homo!).
(...) Friedrich Nietzsche (1844-1900), filósofo e discutido autor deAssim falava Zaratustra e Ecce Homo!, entre outros trabalhos até hoje instigantes, concluiu que Deus havia morrido...
Muita gente ficou indignada com sua afirmativa. Porém, sabendo ou não, o velho Frederico valentemente combatia o deus antropomórfico, criado à imagem e semelhança do Homem aturdido: o deus que persegue, se vinga e mata, o deus sem senso algum.
Esse, Nietzsche tem toda a razão, está morto. Aliás, nunca existiu. Por isso, é chegada a hora de universalmente — porquanto, com atitude antifanática e/ou antipreconceituosa — aprimorarmos o nosso conhecimento sobre Deus (o divino), qualquer que seja a Sua verdadeira essência.
Max Planck —
começo e termo do raciocínio
— Ambas, a Religião e a Ciência da Natureza, envolvem, em seu exercício, a afirmação de Deus. Apenas ocorre que, na Religião, Deus está no começo. E, para as ciências da Natureza, Deus está no termo do raciocínio. Para a Religião, Deus é o fundamento. Para as ciências, Ele é a coroa que remata o edifício das concepções científicas.
Max Planck (1858-1947) foi Prêmio Nobel de Física em 1919. Alemão, enunciou a hipótese de acordo com a qual as trocas de energia se dão de modo descontínuo, em “pacotes” indivisíveis, com o que fundou a Teoria Quântica. Esta tese mostraria seus primeiros resultados concretos anos depois, permitindo a Albert Einstein explicar o fenômeno fotoelétrico.
A resistência ao nazismo custou-lhe o afastamento da presidência da Sociedade Científica que hoje leva o seu nome e, em 1944, a perda de seu filho, Erwin, executado após sofrer acusação de ter participado de um plano contra a vida de Adolf Hitler (1889-1945).
Para os que preferem pesquisá-Lo por efeito de análise racional, certamente o farão de forma aliada ao indispensável antidogmatismo científico e, ipso facto, libertos das restrições à convenção de leis consideradas cláusula pétrea no campo luminoso da Ciência, o que não se pode conceber numa região do intelecto em que a curiosidade sadia, pois isenta, é mola mestra de suas magníficas realizações.
Para os que já creem Nele (autor do Todo e de Tudo, O Criador incriado), de todo o sempre, o Deus Divino permanece. Está vivo, é como o moto-contínuo a transmutar energia e trabalho na intimidade humana.
É eterno, mais do que uma individualidade, mais do que uma equação divinal, é um Poder de Amor, do sentimento que move os mundos, na exclamação de Dante Alighieri (1265-1321), na Divina Comédia.
Deus, Equação
e Amor
Aliás, o maior estorvo para o grande amplexo entre Religião e Ciência, que são irmãs, é a continuação, no palco do saber, do deus antropomórfico, que não prejudica somente o laboratório, como também o altar.
Guerra Junqueiro (1850-1923), combativo poeta português, que ainda hoje provoca silêncio temeroso ou polêmica, canta o Deus Divino em oposição ao deus humano, vingativo e sanguinário, nestes versos tocantes de O Melro, quando um velho abade, comovido com a morte do pássaro, com quem diariamente digladiava, e de seus filhotes, exclama:
“(...) Tudo o que existe é imaculado e é santo!
Há em toda a miséria o mesmo pranto
E em todo o coração há um grito igual.
Deus semeou d’almas o universo todo.
Tudo que o vive ri e canta e chora...
Tudo foi feito com o mesmo lodo,
Purificado com a mesma aurora.
Ó mistério sagrado da existência,
Só hoje te adivinho,
Ao ver que a alma tem a mesma essência,
Pela dor, pelo amor, pela inocência,
Quer guarde um berço, quer proteja um ninho!
Só hoje sei que em toda a criatura,
Desde a mais bela até à mais impura,
Ou numa pomba ou numa fera brava,
Deus habita, Deus sonha, Deus murmura!... (...)
Ah, Deus é bem maior do que eu julgava...”
Certo estava o abade apresentado pelo autor de A Musa em Férias: “― Ah, Deus é bem maior do que eu julgava...”
Ele não tem forma humana. Não se trata, pois, do que tão restritivamente alguns ainda cogitam a Seu respeito. O Ser Humano por enquanto não O vê, mas pode senti-Lo toda vez que, em verdade, ama e Dele se afasta quando odeia. Deus seria, poetizando, uma Sublime Equação cujo resultado é o Amor.
Como o Universo perspectiva um colossal poema em louvor à ação e à beleza, nesta crônica cabe muito bem a apologia que faz da Eternidade o grande pensador francês Victor Hugo (1802-1885):
“Tudo se move e exalta e se esforça e gravita;
Tudo se evola e eleva e vive e ressuscita;
Nada pode ficar na surda obscuridade.
D’alma exilada a senda é toda a eternidade,
que se aconchega ao céu, que a todos nós reclama.
Aos dóceis se atenua a dolorosa flama
da dura provação. A sombra faz-se aurora,
homem e besta em anjos se aprimora;
e pela expiação, escada de equidade,
de que uma parte é treva e a outra claridade,
sem cessar, sob o azul do céu calmo e formoso,
sobe ao universo dor, ao universo gozo”.
A vanguarda de uma Ciência que elevará o Ser Humano a raciocínios, hoje inconcebíveis para a maioria, volta o seu olhar para a Espiritualidade.
Alziro Zarur (1914-1979), saudoso presidente-fundador da Legião da Boa Vontade, selecionou a palavra de diversos luminares do campo científico, na sua Proclamação da Religião de Deus, entre eles:
Albert Einstein (1879-1955) — “O homem que considera sua existência e a de seus semelhantes destituídas de sentido não é apenas infeliz: está quase desqualificado para a vida”.
George Davis Snell (1903-1996) — “Se um Universo pudesse criar-se a si mesmo, encarnaria os poderes de um Criador, e seríamos forçados a concluir que o Universo é Deus”.
Edwin Conklin (1863-1952) — “A probabilidade de se haver a vida originado por acaso é comparável à probabilidade de um dicionário completo resultar de uma explosão na tipografia”.
O compositor, cantor, e ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, com sua marcante sensibilidade, verseja em parceria com o também cantor e compositorArnaldo Antunes, dizendo:
“A Ciência não avança
A Ciência alcança
A Ciência em si”.
Quanta grandiosidade Deus-Ciência oferece ao nosso bom senso investigativo!
O elétrico diretor de cinema Jéan Cocteau (1889-1963), com muito espírito, convida-nos à audácia: “Por não saber que era impossível, ele foi lá e fez”.
Sim, o conhecimento não tem limites. Que seria de nós sem a Ciência?!
Esses são, portanto, alguns dos pontos intensificados na mesa de discussões que acontece todos os anos no Parlamento Mundial da Fraternidade Ecumênica, o ParlaMundi da LBV, e em diversos outros locais. Mas antes, eu propus lá mesmo no ParlaMundi, numa sessão realizada de 23 a 25 de outubro de 2003, que o fórum discutisse a Morte e a Vida após Ela; uma forma de instigar o raciocínio e a percepção espiritual dos expositores do Fórum Mundial Permanente Espírito e Ciência da LBV.
O Saber exige
humildade corajosa
Na Primeira Sessão Plenária do Fórum Mundial Permanente Espírito e Ciência, da LBV, o conceituado físico francês Patrick Drouot esclareceu:
“— Se quisermos entender pela Ciência os fenômenos ligados ao Espírito, temos de mudar o paradigma, a forma de vê-los. Se Você tem certeza sobre si mesmo, sobre as coisas, então não há espaço para Deus tocá-lo. Se Você entra num grau de incerteza, que é a base da Física Quântica, aí sim, Deus pode tocá-lo. Quem quer penetrar no mundo quântico tem de abandonar toda a lógica, toda a vontade de ter domínio sobre a vida.”
Certamente, o dr. Drouot quis observar que, na qualidade de Seres Humanos, limitados ainda a um plano de três dimensões, temos por dever sustentar aberta a nossa inteligência às coisas novas. É inconcebível um cientista dogmático. A Ciência é uma conquista diária.
É importante lembrar que Patrick Drouot é um físico francês, um dos escritores de maior sucesso e credibilidade em todo o mundo. Sua palavra, citada neste artigo, foi proferida durante a conferência que teve lugar no I Fórum Mundial Permanente Espírito e Ciência, da LBV.
Drouot enviou-me esta carta:
“— Excelentíssimo Senhor Presidente Paiva Netto, é com imenso prazer que gostaria de lhe expressar meus agradecimentos por seu convite para minha participação no I Fórum Mundial Espírito e Ciência, que me permitiu apresentar, por duas vezes, diante de sua audiência, meus trabalhos e pesquisas, principalmente no domínio dos fenômenos espirituais e da Fé sob a ótica da Física Quântica e da emergência da consciência da Paz no Século XX.
“— Fiquei bastante impressionado com a qualidade da sua Organização, pela distinção e a capacidade de reunir muita gente. (...)
“— Estou persuadido de que iniciativas tais como o seu Fórum são, além de necessárias, indispensáveis para permitir o estabelecimento de uma ligação entre a Espiritualidade, as tradições e a Ciência, de maneira a permitir o advento da Paz no mundo.
“— Gostaria de agradecer sua delicada atenção com relação ao folheto da LBV em língua francesa, que recebi na ocasião, e de expressar, Excelentíssimo Senhor Presidente, os meus votos mais respeitosos”.
Simpáticos marqueteiros
da Divindade
Convidamos anualmente as maiores cabeças entre os que acreditam em Deus, os que se colocam em posições neutrais e os que se contrapõem frontalmente à Sua existência.
Estes, aliás, acabam transformando-se, mesmo sem o saber, em diligentes propagadores da possibilidade do existir de uma Consciência Enesimamente Superior a qualquer que exista na Terra, pois vivem a discuti-La. Tornam-se, por conseguinte, seus simpáticos marqueteiros (...).
Posições trocadas
“— Amigos e inimigos estão, amiúde, em posições trocadas. Uns nos querem mal, e fazem-nos bem. Outros nos almejam o bem, e nos trazem o mal”(Rui Barbosa, 1849-1923).
(É palmar que, no tocante ao assunto em pauta, não se trata de contenda na qual entra o abjeto ódio, mas apenas de pontos de vista diferentes. Que fiquem no mais longínquo passado os tempos das indecorosas guerras religiosas.)
O conselho do Profeta
No Corão Sagrado diz o Profeta Muhammad (570-632):
“— Cada qual tem uma meta que o guia. Sejam quais forem vossas metas, emulai-vos nas boas ações. Onde quer que estejais, Deus vos reunirá. Deus tem poder sobre tudo.
“— (...) A Deus pertencem o Levante e o Poente. Para onde vos tornardes, lá encontrareis o semblante de Deus. Deus é imenso e sabedor.”
A mais eficiente Política
“— Devemos amar uns e outros: aqueles cujas opiniões partilhamos, assim como aqueles de cujas opiniões discordamos” (São Tomás de Aquino, 1225-1274).
O que São Tomás está propondo chama-se civilização, democracia, ecumenismo, consequentemente respeito entre as criaturas, apesar de ocasionais divergências de opinião. Trata-se de matéria atualíssima, tendo em vista os vastos perigos que ameaçam os povos.
Dito isso, no debate que se instala na rejeição ou na defesa da ideia do Criador, os Seus negadores “provocam” o Ser Humano religioso perseverante, mas acomodado à visão prosaica, mesmo de assuntos sublimes.
E, assim, o leva, pretendendo ou não, a caminhar para o juízo de que Deus é muito mais do que se pensa, até alcançar que a grande missão de Jesus Cristo e de tantos extraordinários pregoeiros foi proclamar que o Mistério de Deus revelado é simplesmente o Amor, de que toda a Humanidade carece, sabendo ou não, querendo ou não querendo. Amar de verdade é a mais eficiente Política.
O Mistério de Deus Revelado é o tema dá título ao Oratório que compus, orquestrado por Vanderlei Alves Pereira (músico e ex-cantor de rock), cujo CD (gravadora Som Puro Records) já atingiu mais de meio milhão de cópias vendidas (disco de platina duplo).
Esta minha obra musical foi gravada na Bulgária pela Sofia Symphony Orchestra e pelo Coro Capela Svetoslav, sob a regência do maestro Ricardo Averbach, que dirige a University Symphony Orchestra, Oxford Chamber Orchestra, dos Estados Unidos.
Irmanação
“— (...) Não há oposição entre a Ciência e a Religião. Apenas há cientistas atrasados, que professam ideias que datam de 1880. Existem, todavia, várias maneiras de se apresentar Deus (o divino).
“— Alguns O representam como o Deus mecânico, que intervém no mundo para modificar as Leis da Natureza e o curso dos acontecimentos. Querem pô-Lo a seu serviço, por meio de fórmulas mágicas. É o Deus de certos primitivos, antigos ou modernos.
“— Outros O representam como o Deus jurídico, legislador e agente policial da moralidade, que impõe o medo e estabelece castigos.
“— Outros, enfim, como o Deus interior, que dirige por dentro todas as coisas e que se revela aos Homens no mais íntimo da consciência” (Albert Einstein, 1879-1955).
Albert Einstein, físico judeu alemão naturalizado norte-americano, Prêmio Nobel de Física, enunciador da Teoria da Relatividade (E = mc²). Os estudos dele contribuíram para que os norte-americanos se antecipassem na criação da bomba atômica.
A Ciência e a visão
completa do Homem
Ora, às palavras do célebre propositor da Teoria da Relatividade (Especial — 1905 e Geral — 1916) e elaborador da “Teoria do Campo Unificado”, que não chegou a concluir, juntamos o testemunho do astronauta norte-americano Edgar Mitchell, ex-tripulante da Apollo 14, que se tornou o sexto homem a pisar a Lua, pronunciado no I Fórum Mundial Permanente Espírito e Ciência, da LBV, em 2000, sugerindo às mentes perquiridoras o abraçar de novas perspectivas diante das questões transcendentais:
“— Quando retornei da Lua, observando esse Cosmos magnífico, comecei a compreender a sua extensão, a enormidade dessas distâncias siderais, as grandes energias e a matéria envolvida.
“— Ainda assim, havia em mim um sentimento acerca de algo que os místicos vêm falando o tempo todo, ou seja: há uma interconexão no Universo.
“— Agora que entendemos o Cosmos de uma forma mais ampla, precisamos de novas respostas para essas perguntas: quem somos, como chegamos aqui e para onde estamos indo?
“— Temos de respondê-las, do ponto de vista de um Ser Humano completo, e não de forma mecânica, como fazemos na Ciência.”
O deus antropomórfico
é uma tragédia
Certo dia, conversava com o jornalista Francisco de Assis Periotto a respeito da existência do Supremo Arquiteto do Universo, como se referem à Consciência Supina os irmãos maçons, e sobre aqueles que são contrários a Ela, talvez por confundi-Lo, como dizia Zarur (1914-1979), com as crenças em litígio.
Em determinado momento, perguntei: Francisco, sabes de uma coisa? Conforme concluiu Guerra Junqueiro (1850-1923) em seu poema “O Melro”, o Deus (Divino) é bem maior do que nós, os Seres Humanos, podemos conceber:
“— (...) Só hoje sei que em toda a criatura,
Desde a mais bela até à mais impura,
Ou numa pomba ou numa fera brava,
Deus habita, Deus sonha, Deus murmura!...(...)
Ah, Deus é bem maior do que eu julgava...”
No entanto, o deus antropomorfo, chacinador, se expressa, entre outras formas, na de Baal, com seu bojo ardente, ou na do deus faminto, que exigia o coração vivo de jovens que o tinham do peito arrancado embora palpitante. Em que é inferior a qualquer gente cruel?
Esse deus humano, que combatemos por ser um engodo, portanto tragédia para a sociedade, é desmascarado com exatidão e ironia sã aqui no “Poema do deus humano”, do sempre lembrado poeta Alziro Zarur, e originalmente publicado em 1935, no jornal A Pátria; em 1949, no livro Poemas da Era Atômica; e reproduzido no Livro de Deus de minha autoria.
“Poema do deus humano
Se daquele Deus-Homem, bom Junqueiro,
O Gênesis foi fácil coordenar,
Inda é muito mais fácil completar
O Gênesis com o Finis justiceiro:
No espaço não havia coisa alguma:
Só o nirvana do vácuo imensurável.
Era a felicidade, a que hoje, em suma,
Preocupa a Humanidade incontentável.
Mas, de súbito, inexplicavelmente,
No imensurável vácuo silencioso,
Apareceu alguém com ar de gente,
Um gigante de fácies tenebroso.
Olhou, ameaçador, o caos profundo,
E pôs-se a bambolear o corpo lasso:
Aqui começa a história deste mundo
E a dos outros que rolam pelo espaço.
Concentrando-se o ilustre cidadão,
Que se chamava Iavé, segundo a História
(Que é mesmo história, como o nome diz),
Não chegou a nenhuma conclusão
A respeito da origem probatória
Da sua aparição louca e infeliz.
Como nascera e para que surgira?
Não havia na espessa escuridão
Nem aviões nem raças de cegonha.
De maneira que o pobre velho gira,
Perplexo, atarantado, trapalhão,
Adquiriu sobrenome: Iavé Pamonha.
Sem assunto, isolado nas alturas,
Obumbrado em terríveis conjecturas,
Sem ter mais que fazer, de uma arrancada
Fez o mundo, um macaco e uma macaca
(Obra vil que não vale uma pataca)
E esperou que brotasse a macacada.
Esta surgiu como estupenda ameaça,
Formando o que chamamos, hoje, massa.
Começa, então, a vida. Os artifícios
Ornavam as macacas, e os macacos
De plácidos passaram a velhacos,
Introduzindo novos sacrifícios.
O velho Iavé ficou como um Vesúvio:
Para acabar com tal patifaria,
Não teve pena da macacaria,
E sepultou-a toda num dilúvio.
Mas eis que do dilúvio se escapole
Noé, cuja família se salvou;
E o imaculado Noé se maculou,
Dando péssimo exemplo à imensa prole.
Ficou, portanto, mais acanalhada
A espécie humana, pródiga de taras,
Sutilíssimas, ótimas e raras,
Conforme o paladar da súcia airada.
Fiado em Moisés, Iavé lhe deu as duas
Tábuas dos dez divinos mandamentos.
Esse espalhou-os pelos quatro ventos,
Pregando pelas casas, pelas ruas.
Mas todos viram nisso o mal de goro,
E ficavam (enquanto o bom Moisés
Quebrava as tábuas e as calcava aos pés)
Dançando em volta do bezerro de ouro.
Como último recurso, o fulo Zeus
Mandou à terra o manso e meigo Cristo
(Que, afinal, nada teve com tudo isto)
E esperou a atitude dos sandeus.
O fim pouco tardou: a Humanidade,
Já farta de sermões e mandamentos,
Crucificou Jesus sem piedade,
Glorificando seus instintos cruentos.
Não tendo mais recurso, Iavé Pamonha
Nas suas obras vãs se concentrou,
Viu, pensou, concluiu, criou vergonha:
Arrependido, enfim, se suicidou.”
... deus humano
e ataque de nervos
Foi evidente, no Congresso Viva Jesus! que mencionei no início deste meu artigo, não louvamos esse deus, sempre atônito, cuja falência foi apregoada, em pleno século XIX, por Léon Denis (1846-1927), tido como o continuador lógico da obra de seu compatriota, o pedagogo francês Allan Kardec (1804-1869), codificador da Terceira Revelação. Escreveu o autor deAprè la mort (Depois da Morte):
“— Fala-se ainda muito de um deus a quem são atribuídas as fraquezas e as paixões humanas, porém esse deus vê todos os dias diminuir o seu império”.
Imaginemos que esse “fulo Zeus” sofresse um ataque de nervos... O Universo estaria em maus lençóis…
A questão é que parte das gentes parece ter-se acostumado de tal forma a enganar-se a si própria que até hoje se comporta como se o deus criado à sua imagem e semelhança devesse prosseguir em largo mandato... E, como assim raciocina, age segundo os atabalhoados “ensinamentos” dele. Dá-se mal, então...
O curioso é que, quando as coisas não terminam como o esperado, voltam-se contra o Deus Divino, que nada tem a ver com a entidade caricata produzida à maneira do bípede pensante... Nem sempre bem pensante, por sinal...
Aquele que enaltecemos é exaltado na página 286 do meu Livro de Deus, lançado em 1982 (já esgotado), que apresenta a sequência da magistral pregação doutrinária (religiosa, filosófica, científica e política) de Alziro Zarur:
“Poema do Deus Divino
O Deus que é a Perfeição, e que ora eu tento
Cantar em versos de sinceridade,
Eu nunca o vi, como em nenhum momento
Vi eu o vento ou a eletricidade.
Mas esse Deus, que é o meu eterno alento,
Deus de Amor, de Justiça e de Bondade,
Eu, que o não vejo, eu o sinto de verdade,
Como à eletricidade, como ao vento.
E o sinto na ânsia purificadora,
Na manifestação renovadora
Do Belo, da Pureza, da Afeição.
Com Ele falo em preces inefáveis,
Envolto em vibrações inenarráveis,
Que me trazem clarões da Perfeição. (...)
Bondade — que os pecados não consomem —
Do Espírito Divino aos filhos seus:
Deus sempre desce até seu filho, o homem,
Quando o homem sobe até seu Pai, que é Deus!
Pois creio é nesse Deus imarcescível
Que ampara a Humanidade imperfeitíssima:
Deus de uma Perfeição inacessível
À humana indagação falibilíssima”.
Usar corretamente o
seu livre-arbítrio
Alguém pode arguir: “Mas o que Zarur quis dizer com esses versos? Deus então só vem a nós se formos a Ele?”
Chegou, agora, a minha vez de contra-argumentar: e o livre-arbítrio, meu irmão?! Você se esqueceu dele, minha Irmã? Faz-se tanta questão de ter a sua posse... O que, aliás, é bom.
Do contrário, Deus não o teria estatuído como desafio ao nosso desenvolvimento humano-espiritual. Emmanuel ensina, na psicografia de Francisco Cândido Xavier (1910-2002):
“— Deus é o Pai justo e magnânimo. Um pai que não distribui padecimentos. Dá corrigendas, e toda corrigenda aperfeiçoa.”
Zarur debruçava-se, estudioso, sobre as lições do Cristo Ecumênico, incluída esta, impressa no Evangelho de Jesus, segundo São Lucas, capítulo 17, versículo 21: “O Reino de Deus está dentro de vós”, o que significa dizer que a verdadeira felicidade também.
Em 25 de março de 1990, numa página dirigida aos que enfrentam os dramas da existência, constante do meu livro Tratado Universal sobre a Dor, apresentei o meu ponto de vista sobre a verdadeira felicidade.
A alegria construída sobre falsos valores é amargosa, como aquele livrinho de que nos fala o Apocalipse de Jesus, capítulo 10:9: doce na boca, mas amargo no estômago; isto é, feliz na exterioridade, porém lastimosa quando atinge o interior do Ser Humano.
Ora, o seguidor da Palavra de Deus não pretende esse tipo de satisfação. Ele quer Jesus.
O aprazimento mundano é sempre anúncio de calamidades e dores para os que sofregamente o perseguem. Não há maior júbilo do que pregar o Amor de Deus aos Homens. Entretanto, quão difícil é semelhante tarefa!.
Incentivo aos corações
Contudo, o intuito maior, ao versejar em torno da relação Criador–criatura, é levar aos corações um incentivo para o progresso individual, realçando a necessidade que temos de crescer interiormente, de evoluir na escala universal, conquistando vitórias espirituais
É como vemos nesta Fórmula Urgentíssima de Jesus Cristo: “Buscai primeiramente o Reino de Deus e Sua Justiça, e todas as coisas materiais vos serão acrescentadas” (Evangelho do Cristo, segundo Mateus, 6:33).
O que Jesus quis dizer com isso? Que se conhecermos as Leis Espirituais em primeiro lugar, consequentemente saberemos resolver os assuntos materiais. Isto é que falta à Economia humana: analisar, convencer-se e aplicar. Não custa experimentar.
Veja, consequentemente materiais, sendo estas um dos efeitos da prece, da reza, da oração ou da meditação profunda. Uma consequência da prece, explica o Senhor Jesus: “Tudo o que pedirdes a meu Pai, em meu nome(pelo exercício da oração), crede que o havereis de receber, e vos será concedido”. (Evangelho segundo Mateus, 21:22; segundo Marcos, 11:24; e segundo João, 14: 13,14).
Evidente que o Divino Doador se refere a pedidos justos, mediante o nosso próprio mérito.
Quando você ora, alcança benefícios de Deus que nem imagina. Por isso, é essencial que o livre-arbítrio seja bem empregado. É preciso que, pelo seu bom desempenho, você amadureça, suba, cresça para merecer que Deus baixe até onde estiver. Senão, poderemos cair naquele estado de coisas em que tudo é tão fácil que ninguém dá valor, pois logo se desinteressa.
Além do mais, o que o Poema do Deus Divino ensina é que se deve usar, da melhor forma possível, moral e eticamente, as suas próprias escolhas, porque quem vai pagar a conta carmica é quem faz uso delas.
Buda Sakyamuni (560-480 a.C.), conhecido como Muni (Sábio) e Sakkya (Clã dos Sakyas), o Sábio dos Sakyas designa seu título de Sidhartha Gautama, após ter atingido o estado de iluminação. É então que ele começa a pregar a doutrina budista em Benares e no sudeste da Índia.
“— O conhecimento da Verdade destrói todo o mal, como um sol que brilha num céu sem nuvens. O verdadeiro iluminado permanece firme, apartando os véus da ilusão” (Buda Sakyamuni).
Ecumenismo da Alma
e do Coração
Com certeza, com o advento do Congresso Viva Jesus!, muito mais que no plano da matéria, toda pessoa simples de coração está sustentando uma doutrina ecumênica, não do Ecumenismo restritamente religioso ou limitado aos cristãos, mas aberta a toda pessoa de real Boa Vontade na alma e no coração.
Zarur, ao abrir a Legião da Boa Vontade, lançou na década de 1950 a Cruzada de Religiões Irmanadas, antecipando-se ao hoje denominado inter-relacionamento religioso, oferecendo esse triunfo ao nosso Povo. Não foi sem motivo que o filósofo italiano Pietro Ubaldi (1886-1972) declarou:
“— A Legião da Boa Vontade é um movimento novo na história da Humanidade. Coloca o Brasil na vanguarda do mundo.”
Ainda quanto ao Ecumenismo que pregamos, trata-se também do relativo às criaturas e aos corações daqueles que, sabendo exprimir o seu ponto de vista, o qual defendem com intensidade, admitem ser inafastável a premência de se manterem os sentimentos solidários, fraternos, compassivos, conforme explanamos na revista Sociedade Solidária, que, em vários idiomas, está correndo o Planeta. Do contrário, quem restará para contar a História?
Sublimar o espírito religioso
A Paz desarmada jamais resultará apenas dos acordos políticos, todavia, igualmente, de uma profunda sublimação do espírito religioso.
Abraão Lincoln (1809-1865), lembrado como o abolicionista norte-americano da escravatura negra em seu país, é um dos baluartes da moderna democracia e uma das maiores figuras da história dos Estados Unidos da América.
Em 1860, disputou as eleições para a presidência da República, tornando-se o 16º presidente estadunidense. Ao iniciar seu governo, em 1861, enfrentou a separação de sete Estados escravistas do sul, que formaram os Estados Confederados da América.
O velho Abe, entretanto, não reconheceu essa separação, ratificou a soberania nacional sobre as unidades rebeldes e, exortando-as à conciliação, garantiu-lhes que jamais partiria dele uma ofensiva armada. Porém, os separatistas tomaram o forte Sumter, na Virgínia Ocidental, levando o país à famosa Guerra da Secessão. Os confederados renderam-se em 9 de abril de 1865, em Appomattox, Virgínia.
Na noite de 14 de abril de 1865, uma Sexta-Feira Santa, o ator John Wilkes Booth (1839-1865), defensor da escravatura negra e com forte ligação com os confederados, membro de uma notável família de atores, assassinou Lincoln, no Teatro Ford, em Washington, Estados Unidos.
Ele disse certa vez: “Quando pratico o Bem, sinto-me bem; quando pratico o mal, sinto-me mal. Eis a minha religião”.
Ora, ninguém poderá chamar o velho Abraão Lincoln de incréu. Não acompanhar qualquer rebanho religioso não significa desacreditar numa Inteligência Justa e Suprema.
A herança deixada pela Era da Razão, do Iluminismo, aliada à Fé Realizante que desenvolvemos na nossa labuta diária, permite-nos melhor compreender um Deus cuja Face é Amor, por sinal muito bem expresso nas palavras de Lincoln.
Portanto, eis uma das motivações do Fórum Ecce Deus! que estamos lançando ao debate dos Seres de Boa Vontade e de bom senso, crentes ou descrentes há tantos anos.